Teoria da Viagem.

“Eu digo sempre, em vôo, que a geografia deveria ser ensinada às crianças em aviões, conduzindo-as gratuitamente de um ponto a outro, para dar-lhes a ocasião de ver o campanário de uma aldeia natal, de constatar o recorde de cidades, de captar uma única visão seu desenho traçado no campo ao redor, de seguir com o olhar o leito de um riacho, de um rio, de um curso d’água, de ver transformados em espelhos densos e luminosos os açudes os lagos os pântanos nos quais se reflete o sol. Lições de geografia para aprender a amar seu país de maneira viceral”. (PG 69-70) Descreve a emoção de Michel Onfrey em seu livro Teoria da Viagem.
Eu acrescento: deveria estar nas leis dos direitos humanos a oportunidade de viagem a cada cidadão, pelo menos uma vez na vida.

O que dizer sobre as viagens, além de concordar com as idéias de Michel!
A viagem é um sonho que se torna realidade. É nas viagens que nos transformamos. Vemos o mundo de maneira intensa, unimos todos os nossos sentidos e nossas sensualidades na conquista de um lugar do conhecimento, do prazer e do descobrimento. Nossa curiosidade se aguça, nosso paladar sobressai e tudo se eterniza em nossa memória de maneira única e particular.
A viagem é única e individual. Quando partimos para uma viagem, se em duas ou mais pessoas, ou em uma excursão, a geografia é a mesma, a culinária é a mesma, a temperatura, o clima são os mesmos, mas a expectativa de cada pessoa é diferente.

O individualismo é total: um serve de auxílio, de escora e de estímulo ao outro; mas o individualismo é exclusivo, cada um desenvolve expectativa e a atenção se difere.
Como a definição de percepção: do grego, “porta para o mundo”.
Definição de percepção: a sensação e percepção configuram um conhecimento corpóreo, sensorial ou empírico dotado de sentidos, ou seja, integrado em nossa vivência particular e dela dependente… (dicionário Sesc A LINGUAGEM DA CULTURA)

Perceber o mundo – sensibilidade .
Sentidos: Visão, audição, olfato, tato e paladar. Todos esses sentidos são particulares, exclusivos e individuais.
E é nesse caminho que seguimos nossa viagem. Quando Michel diz que, da viagem, a primeira instância ficam quatro ou cinco lembranças e que depois de nos reorganizar revemos as fotos os vídeos, acrescento que neste momento, vem a música, o paladar e, muitas vezes, buscamos lembrar os paladares para, talvez, trazer um pouco de tudo que vimos e vivemos naquela jornada.
A cultura e a etnia do local são nos dados de forma mágica, muitas vezes, não damos conta de que, em mundo totalmente globalizado onde carregamos nossos contatos com o mundo que deixamos, podemos estar vivenciando, de maneira tão viva, a realidade de tribos que nunca tiveram contato com o mundo externo, mais uma vez: individualidade, exclusivo e único.

Está relacionado à cultura da viagem, o olfato: nada é mais marcante que o odor de um lugar totalmente novo, onde a vegetação, as flores, a terra ou o odor de um alimento, de um perfume ou mesmo das pessoas, são sensações individualistas e únicas, onde cada um capta à sua maneira.
“Os cheiros envolvem-nos, giram ao nosso redor, entram em nossos corpos, emanam de nos. Vivemos em constantes banhos de odores” que na viagem sobressai de maneira exaustiva.
Esta percepção é o relacionamento do corpo estimulado ao entorno, onde o que estamos consumindo é sensação da viagem em sua forma exclusiva, única e individual.

Onfrey diz que as viagens não são para nos encontrar, não vamos à busca de nós mesmos, pois nossas sombras caminham ao nosso lado. Feliz do viajante que tem essa consciência, pois poderá desfrutar de si mesmo e se redescobrir em pequenas atitudes que ficam adormecidas enquanto estamos sedentários, e que, na viagem, tem a liberação de sua essência, pois deixamos de lado todo senso critico de nossa sociedade e partimos livres para os descobrimentos.

“O prazer é basicamente e do significado simbólico dos objetos e ao nível do próprio indivíduo naquilo que ele pode ser”.

Esta percepção é o relacionamento do corpo estimulado ao entorno, onde o que estamos consumindo é sensação da viagem em sua forma exclusiva, única e individual.
A felicidade faz parte da viagem, pois é no individualismo, manter-se em si mesmo porque a investigação filosófica é reflexiva. O indivíduo é seus pensamentos. Aí está parte da viagem.
Apesar da troca, que, como diz Ofrey, é em geral supérflua, restam nós mesmos e nossos pensamentos, uma redescoberta e uma cultura de nós mesmos. “Não importa o que nos aconteça o que importa é nossa atitude diante ao que nos aconteça. São atitudes que deparamos nas viagens que precisam ser tomadas individualmente e exclusivamente.

Vimos em Demócrates – “A continuidade da virtude da sabedoria e da felicidade, disponibilizando o conhecimento da ação”.

O encontro com a felicidade é inerente na viagem e quando nos deparamos aos fatos, à ação, nos conduz ao reconhecimento de nós mesmos. Mais uma vez a individualidade e a exclusividade da ação.
Ser nômade é renovar, estar em diversos locais, conhecer a diversidade do mundo, pois ela é nossa grande riqueza.
Viagem tem o lado efêmero , quando Gilles Lispovetsky coloca que “o efêmero é aquele que tem validade e o eterno, aquele que permanece”.
Quando buscamos a superficialidade do modismo, do global, do igual, das grandes capitais que nos apresentam as mesmas características banais de qualquer outra, estamos no lado efêmero das viagens, enquanto que quando buscamos a realidade cultural das vidas sedentárias, estamos buscando o lado eterno da cultura e da viagem, e, sem dúvida, esta permanece em nossas mentes e em nosso individualismo.
Hoje temos a facilidade, tanto da comunicação como do transporte, que nos deixam tão próximos de qualquer local do mundo com o máximo de conforto e segurança, como diz Ogfrey “quando vejo algo tão grande como uma aeronave que se torna tão pequena no espaço, eu me assusto, vê a pequenas que somos e de onde vivemos”.

Conclusão:
A viagem é inerente a nos mesmos, é o luxo nato, o individualismo de todos os sentidos, a experiência mais profunda e mais verdadeira que podemos nos oferecer, a felicidade que se renova a cada lembrança, a cada sabor revivido, a música que nos remete ao local, na memória fica o olfato este não podemos transportar e sequer fotografar.
“O desejo de colocar em palavras escritas nossas sensações e emoções vividas já que na tentativa de transmitir o que é individual nos tornamos às vezes chatos”. As viagens é o luxo que todos deveriam ter e viver pelo menos uma vez na vida.
Valéria Foz

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